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DESTAQUES

Nada, como estar entre a gente

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  Voltando de qualquer lugar, como que nunca tivesse saído. Um certo mal-estar  que arrepia a pele que recobre os ossos. O nojo na garganta, uma remessa fechada do estômago. Voltou o frio, um ventinho bom, aquela sensação que logo chove, alguém vai berrar contigo ou fazer cara de estrutura governamental, vai dar um salto `a sua frente, e, com uma flanelinha dessas de posto de gasolina vai polir pedras pintadas de branco ou escarrar a alma ali mesmo. Não é a cidade, o lugar de novidades e interesses, e nem nada, acho. Vai ver que nem-isso. Dá um certo frio no estômago como que tivesse invadindo uma reunião secreta de uma facção armada e uniformizada.     Olhos sombrios que riem mostrando os dentes,  um olá que se ouve com o peso do sarcasmo, de uma ironia a respeito de um pertencimento de ordem familiar de grupos coesos usando máscara frente a um banco. Mas estão na igreja, no restaurante. Há sempre uma promessa sexual, uma tosse no ar que mostra os seios da garganta. Conversa-se com in

Nota de esquecimento

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Nota de esquecimento:  A vila tinha seus infortúnios, a vila de vilões cheios de perigo, causava certa ameaça nos sentimentos, a gente ficava com a alma sentada, as noites mornas que matavam a claridade, qualquer bem. E se dizia que se amava quando não corria muito pavor, uma bebida amarga, dor de vida e desejo de esconderijo.      Marianize tinha os olhos inchados, graves, pesados, pareciam duas bocas abertas, vermelhas, sem dentes, profundas que quase falavam. Fugia do Japinho, que era como uma caixa de  pinho. Casada com ele no papel esticado na mesa de algum juiz distraído. A boca, como era linda. Parecia um olho imenso, vermelho, de íris de fundo escuro como um túnel, um fim de começo, uma voz de cílios de junco à beira de um lago, moventes, dolentes, leves e como bigornas escuras com verde farpado.      Gostava de mim, me achava boa pessoa. Olhava para mim como uma mãe que esqueceu de perder os nove meses incansáveis de espera interminável. Olhava atentamente como que um arrepen

E em casa

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     E fosse de tarde, dessas ôcas, iria pescar. Levar o cão à corrente do rio, fingir cansaço, café frio, pão guardado, dividir com o bicho minha alegria de viver. Apenas com ele, porque outro algum entenderia. Em casa outra vez e novamente cheio do não dito.           E voltaria para casa novamente, muito tarde, madrugada, de carona, o carro esquecido ao lado do teatro, deixado na rua do centro, e voltaria ao trabalho a pé, quanto fiz disso, para ter a sorte de encontrá-lo e sair para dar uma volta a fim de perder o esquecimento.           E cantaria à tarde, massacraria o piano, apitaria as cornetas, riscaria o ar com flautas a machucar ouvidos duros, assim com tomaria banho outra vez na chuva e me deitaria no jardim sem ouvir nada mais que a voz das nuvens. Estou em casa, um silêncio que bate às paredes, ninguém que ouve o que digo houve.           E faria tudo de novo, com a mesma alegria que tive. Todo o meu bem estar que me roubaram. Em casa, tarde, fome, como um prego, pão com

Carmim

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Estava no banho. Não, era o telefone.      Foi um acaso. Não tive tempo, a correria, sabe, as coisas, tive que tirar o pó. Não pude, sinto.      Como assim?      Mas não fiz nada. Só porque disse aquelas coisas. Não foi nada, o gerente não viu, não ouviu.      Que coisa moralista.      Não, não quiz dizer isso, ao contrário. Eu falei. Uma atitude de certeza, sabe. Errar não é tudo. Tá.      Tá, tá, vá. Vá de uma vez. Pegue suas amarrações, sua mandinga que me faz idiota. Sai. Dá a sua volta, fume um cigarrinho, pense diferente se possível, dance debaixo da árvore, deixa o vento, que se lasque o dia.      Para quê, me diga, tudo isso?      Cai o sabonete.      Sabe bem que durmo sem você ao meu lado. Vai e volta, vai e fica, fica e não vai.      Mentira. Sabe melhor que eu.      Fica. Fica de uma vez, se enrola no cobertor, deite sua cabeça em meu ombro, não me importe que ronque que faça sons absurdos, que assobie e chame o seu pai, sua mãe e outras pessoas que acha carmim.      El