Frente ao nada

O mais cedo possível foi quando, madrugada, entre despertar e dormir não era tarde. 
E o mais tardar, quando a manhã batia à janela o sopro do inverno, buscava em algum lugar as horas perdidas.
Viesse com a chuva o sol, tivesse neblinas no jardim, passasse o tempo sobre a minha cabeça feito um raio que anunciasse tempestade.
Onde estivesse, qualquer dia era uma sombra na pálida luz da incerteza.
E quanto mais o cão corresse entorno da casa e contra os portões, perseguindo o intruso, seguia-se a quietude, esse eco do vazio.
O aviso de que há dor no peito, alguma desesperança como quem espera a notícia de algo infame.
E nem era início o que havia nele de fim.
Bate à porta a guerra, e se sabe bem, que vivemos a trégua, o momento dos ataques ímpios.

Que isso é trabalho, que se continua depois, e quando frente ao nada cansa do descansar. 
Molho os pés na água na esperança que esse embalar turbulento  pare.
O distante é tão perto. Vejo o equilibrista afoito sobre o fio do horizonte um sujeito que cai sobre a sua individualidade.
Não é por menos que Aurora me disse para carregar a cadeira junto à areia e ver os barcos partirem, mas ele chegam de qualquer lugar, e ela não sabe disso. Aproveito o sal, o tempero que a batida da onda leva e empurra. 
Fica o corpo e parte a alma ou a alma vai com o corpo para qualquer lugar.
Quebro em pedaços para ter a inteireza de que tudo se despede, de que segue.
Para aonde vão os momentos doces nem se sabe. Retornam em partes banhados.



Postagens mais visitadas deste blog

Nada, como estar entre a gente

Clientes amigos

Na ponte, Maria