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Pedaço esquecido

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   Ele chega e vê o pano vermelho no canto escuro entre o sofá e aquele abajur de alças com pantalhas amarelecidas que ganhou na primavera passada quando seus parentes, cansados dele, resolveram dar fim à tralha, e assim o acudiram terminantemente para suas leituras ocasionais. O fato de sentar ali para ler - mesmo que mal pudesse manejar o livro -, fazia do recanto algo persecutório, um lugar fundado no desejo, por isso reconhecido antes, percebido antecipadamente. Ele entra com a certeza do lugar, por isso vê o pano entre o sofá e a luz desejada. Claro, ela sabia disso. Tanto que sofria de ciúmes daqueles livros à volta com o abajur e procurava impedi-lo de aproximar-se revolvendo páginas marcadas, redistribuindo a ordem ou o convidando para outra coisa como tomar um suco. Com o copo amarelo de suco às mãos dizia: - Querido, vai ler?  A pergunta tão doce é uma exigência, força de controle para antecipar o desejo tentando vivificar outro interesse, uma vontade escondid...