Fotografia de família


Fotografia de família
Pedro Moreira  N.




Tudo bem, dizia papai, não se mexam agora. Dêem um sorriso, falem família. Pronto, saía àquela foto com cara de família. 
Ele calculava, via sol, punha a gente de um lado e de outro. Mamãe aceitava aquilo como se fosse um milagre termos alguém tão amável a nos projetar para o futuro numa imagem inesquecível. Ai como fico lindo! Ficou. 
Antes de vir para Curitiba papai me contou que já havia se dependurado de cabeça para baixo nas Sete Quedas para uma foto que saiu na contracapa da revista Cruzeiro. Muita gente nem imagina o que seja isso. Mas posso imaginar o esforço que teve na luz certa e no diafragma, no frêmito de um clic para unir uma família para sempre. Estou pensando nele, podia falar de mamãe que o amou e cuidou realmente.
Ir para escola, voltar da escola e cantar uma canção para mim era a mesma coisa, para ele não. Tratava tudo com solenidade, considerava ir para algum lugar como um ritual de partida que não poderia passar despercebida, assim a chegada, o retorno devia ser pomposo e de elegância. E cantar uma canção devia ter tudo, o ir e o voltar no equilíbrio afinado sem perder o motivo. Tudo se reverbera, um abraço, um aperto de mão, um aceno deve ter significado. Era como dar importância a tudo na vida e fazê-la num átimo, isto é, num único momento. Estou pensando nele, podia falar de mamãe que o amou e cuidou realmente.
Quisera não lembrar minhas lágrimas quando por fim, deitado em sua cama piscou e me acenou amorosamente pela última vez. Mas lembro de seu sorriso definitivo, de sua cara cansada e de seu olhar agudo. As mãos abanavam delicadas a dizer adeus. Perguntei por que ele havia nos deixado, o que foi, por que isso aconteceu, ele prometeu que ia ficar. O sujeito sensacional sumiu da minha vida e tive de aprender a correr para pegar a mesma idéia, ou mudar o tom de alguma conversa, saber olhar com agudez e força.
Era isso que um pai representava para qualquer menino que enfim cresce e se casa e tem filhos e de repente, e é assim mesmo que acontece torna-se capitão de um navio invisível, carregado. Na idade em que estou, andar pelas ruas com o meu chapéu e as barbas brancas é mesmo essa impressão que dá. Lá vai o capitão do navio. Ainda hoje tiro fotos, reúno a família como o meu pai ensinou. Mas sou diferente, sou muito parecido com ele, sou meio amado comoelefoiesouelemesmo. Fiquemjuntos,agoradigamfamília.Afinal,eleeratudoqueeu queria ser. 

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