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Telefonema

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Telefonema Pedro Moreira Nt Carlos, oi, estou te telefonando porque venderam a rua da minha casa, sim.Isso mesmo! Não sei exatamente quando, acho que ontem, tinha uma placa de negócio fechado, algo assim, e estou em apuros.Eu te explico se tiver paciência, a questão é que não tenho como sair de casa.Devo pagar pedágio, ou sei lá, ou qualquer coisa.Tenho medo que me revistem ou que me ameacem, ou que algo venha a acontecer se pisar em solo privado.Eu sei que era, era, não é mais público é de um sujeito, um baixinho dono de uma lavanderia.Não sei.Lavanderia, eu já lhe disse.E agora? Poderia me ajudar? Talvez eu tenha que pedir à prefeitura o direito de realizar um túnel aqui, o que acha? Não é possível, passa pela lei das demarcações em profundidade, entendo.E se fizer uma ponte? Não? Só se tiver altura além dos carros e caminhões, e ainda teria que pedir uma licença no tráfego a aéreo? Pagar taxas na administração de reserva de mercado para engenheiros formados, sei.Mas

O ato

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O ato Pedro Moreira Nt Entrou em cena com aquelas caricaturas. Se debateu frente ao público em busca de alguma verdade. Na platéia estava toda a animação. O desenho vivia em suas veias. E o público era o reflexo da última propaganda sobre heróis, mas nenhum deles venceu Aquiles até hoje.  Dava certo. Quanto mais superficial, mais era profundo porque a superficialidade acredita que o supérfluo é um presente dos deuses. Então, aplaudiam. E riam também.  Eram sacos de risadas programadas para cada cena, eram aplausos e efeitos especiais desses que anunciam que o alarme do carro está ligado. A verdade. Quantas vezes se mergulhou na impureza em busca da claridade? Quantas vezes saíram dali crentes de que haviam conseguido tocar a raiz das águas.  Mimos, faziam aqueles movimentos de surpresa.  Na saída do espetáculo um dos personagens pagos da direção olhou quase nos olhos de outro personagem e lhe disse: eu-te-amo. A voz saiu afônica porque o equipamento humano ficara muito tempo

Pague e mande

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Pague e mande                              Pedro Moreira Nt Sentada à mesa, olhos pequenos estavam margeados por uma napa pressionada sobre o edredom da pele. Surgia do túnel algumas varas crispadas de cílios onde o espelho refletido mostrava as camadas do sorvete que a qualquer momento seria atacado por bonitas pás carregadeiras de alpaca polida. As sobrancelhas afinadas e quase toda arrebatada por uma mania de se flagelar em quase todas as manhãs de domingo ensolarado, retirá-las à pinça.   O cabelo liso, esfiapado, mantinha forçosas e trágicas   ondulações que lhe traria, pensava, alguma dignidade. A boca foi toda debruada com a entrada de uma espécie estranha de gordura química que inchava ferozmente os lábios,   a fim de enaltece-lo, e a mostrar que ao pronunciar qualquer palavra sacudiria, em um quase vibrato, as intenções mais baixas que qualquer um em sua banca de convidados imaginaria  adormecidas.  - E, mais. Mais muito mais, minha cara.  A orelha escondida po
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Percepção a diesel

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Percepção a diesel  Pedro Moreira Nt    A casa do doutor era muito extensa, altura e largura com grades de pontas protetoras contra cidadãos inadequados ao seu padrão de vida. As cores, e a arquitetura toda era um neoclássico que lembrava a casa de campo da rainha desenvolvida de um país conhecido pela TV. O jardim um tanto barroco, um tanto arcaico com estátuas de mulheres nuas feitas de cimento com coroa de flores e água artificial saindo de jarras. A novidade era uma planta da Malásia que aflorava à noite e de dia não suportava o sol e dormia seu longo sono. Flor de defunto em todos os cantos com suas luz colorida. Era bonito e ao mesmo tempo triste. - Que casa! Ele estava encantado porque notou acima das lanças prateadas da grade uma inscrição: cerca elétrica. Fios e mais fios de um campo de concentração abandonado estavam distribuídos pelas linhas laterais e entre os hibiscos junto ao muro. - Estou satisfeito com tudo isso! - O que quer dizer? - Até aí eu

Amar, inclusive

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Amar, inclusive* Pedro Moreira Nt Corre o mercado empinando o carrinho para o primeiro dia de férias, faz as mais perigosas curvas e desliza colhendo rapidamente todo o tipo de mantimento. Descendo os canais sujos, viaja por entre gôndolas lotadas, desvia de velhas e obesas desleixadas, crianças choronas, pais irritados em filas intermináveis, desafiando o mundo, veloz, ofegante. Cresce a impaciência a cada estreita encruzilhada, quando empurra algum comboio estacionando, quando quer alcançar um produto que se escassa ou , pior que tudo, devolve latas amassadas, legume velho, produto com a data vencida e outros empecilhos que só a sujeira é capaz de fazer. Quando isso acontece, xinga, esbofeteia no ar a cara imaginária do gerente, o dono, o governo e seus ministérios com aquela calma de quem está louco da cara e faz de conta que canta. A velocidade aumenta, as curvas são chocantes, apertadas, desvia de alguns fiscais, pula à frente do remarcador de códigos